Monday, May 25, 2009


Mais um ano, mais 365 dias cumpridos, uns melhores que outros mas sempre nas melhores companhias... mais um jantar com amigos, não com todos os que desejaria, uns por motivos profissionais, outros por mero esquecimento meu, mas um jantar muito agradável, com o tal bife-maravilha (vá-se lá saber porquê) e regado com o tal néctar que dizem dos deuses.
Rumo ao sitio do costume, mais uns copitos, mais um shot, a lingua solta-se e os constrangimentos também, conhece-se meio café e fica-se intimo do ser para lá do balcão: "mais um para mim e aqui para a minha amiga...um daqueles brancos que pegam fogo"...até vizinhos se conhecem, que moram aqui a 15 metros, enfim...Vem-se cá para fora e.............................................................................................................................................................................................................................
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"vamos levantar um bocadinho e mudar este lençol, sim?" - diz uma voz abafada e segura...."vamos lá, dê só um jeitinho, sim..." - continua a voz segura e já um pouco impaciente.
Salpicos pretos de qualquer coisa que já tinha sido comida ou bebida abusavam daquele lençol...o cheiro acido fazia corar de vergonha qualquer detergente mais eficaz.
Sinto uma dor aguda na costa da mão esquerda. Olho para a voz abafada e segura e vejo uma rapariga, de branco, com uma máscara na boca. "Sabe onde está?" - pergunta ela enquanto regula um saco de soro . Começo a olhar e penso "foda-se, foda-se, foda-se....outra vez não, outra vez nãooooooo".
O dia já entrava obscenamente pelas janelas do hospital. Tentei levantar-me rapidamente mas não aguentei e comodamente voltei à posição inicial. "Deite-se um pouco, só mais um pouco, está bem?" - e a rapariga de branco saiu, como se aquilo que me estava a acontecer fosse mesmo aquilo que ela estava a contar. E desapareceu pelo meio de macas e cortinas. Deixei de a ver... O corpo doia, a costa da mão ardia, o estomago deveria ter um sinal por dentro de perigo e inflamável. Vou arrancar isto da mão e sair rapidamente, sem ninguem ver...não, vou antes dormir mais um bocado, não me sinto nada bem, pensei. Havia um velhote numa maca em frente que me olhava perdido. Não sei se olhava para mim, se através de mim. Noutra maca ao lado um rapaz com as calças quase pelos joelhos, boxers de fora, de igual maleita à minha. Uma enfermeira tentava acorda-lo, tal como a rapariga de branco fizera comigo. “Estará alguem à minha espera? Quem estará lá fora? Se calhar ninguem, foram embora e ainda terei de ligar e esperar...ou apanhar um táxi, sei lá”. A rapariga de branco, agora sem a voz abafada pela mascara vê-me e diz: “vamos tentar sentar, sim?” e apoiando-me nela lá me consigo sentar e ter uma perspectiva mais correcta do sitio. A minha roupa era uma amálgama de manchas escuras, podres e acidas. A camisa colava à pele, a ganga colava à pele, as sapatilhas colavam às meias. Enquanto voltou a desaparecer procuro o meu telemovel. “Preciso de telefonar para alguem, preciso de falar com alguem”. Afinal estavam à minha espera. Digo à rapariga que quero ir embora. Ela olha não muito convencida para a saca de soro e diz que vem já. “olhe, desculpe, desculpe” – começo eu a ouvir – “olhe desculpe, desculpe” “olhe, desculpe, desculpe” até que olho não acreditando ao inicio que seria para mim. Ninguem no seu perfeito juizo quereria falar comigo, nao assim, não como eu estava, não naquele estado. Olho e vejo o rapaz dos boxers já sentado e a olhar para mim e pergunta-me “ Como é que se sai daqui? Como é que eu vim cá parar?” Simpaticamente, tive de me rir. Não consegui senão rir e encolher os ombros. Acho que não falei. Acho que ele não reparou em nada que tentei comunicar-lhe pois voltou a deitar e a inanimar. Volta a rapariga de branco e pede-me para agora por-me de pé. Coloquei-me em pé com a sensação que estaria a aprender a andar, tal como um doente em fisioterapia...”Será que não vou cair? Será que me aguento?”, pensei. As pernas termiam um pouco, não pela bebedeira mas pelo nervosismo da situação, do momento. “Espere um pouco” – disse-me ela. Desaparece e aparece rapidamente com um algodão embebido em alcool talvez. Pressiona-mo na costa da mão e retira-me o cateter e pede-me para fazer força na rama do algodão. “Dói e arde que se farta esta merda”, pensei eu. Dois minutos depois aparece-me com o meu dossier, que não tive tempo nem capacidade para ler e direcciona-me para a porta. O segurança manda-me para o guichet com um olhar ao mesmo tempo indiferente e condenador. “ Sr. Helder, a sua morada?” Lá articulei as palavras o melhor que pude e sabia, longe tinham ficado os acenares e os monossilabos. E, curiosamente pergunta-me: “Está preparado para a taxa?” Achei curioso e pensei para mim: “depois disto, estou preparado para qualquer merda”. Procuro a carteira e o cartão e saio com o meu recibo. “Preciso urgentemente de um cigarro” – pensei eu e lancei-me ofegante a um homem na entrada do hospital que me diz automaticamente, quase ao mesmo tempo que olhei para ele: “Só tenho este, deixei lá dentro o maço” – obvio, pensei eu, é staff daqui, desgraçado estava se andasse com o maço às almas que pairam aqui. E de repente, do outro lado da rua, a sairem do café, vejo duas caras queridas, os meus grandes amores, as pessoas mais especiais da minha vida, que me confortaram a alma e me apaziguaram o espirito. Não aguentava de vergonha, embaraço e alguma culpa. Mas amigos são mesmo isto: sempre lá, sem censuras nem contas a prestar. Foi um grande 31 que arranjei.

5 comments:

Anonymous said...

What a night my love :)

Gostei particularmente do apagão................................................................se quiseres, posso sempre ajudar a preencher o post dessa parte, pois estive sempre lá e acredita que não me esqueço...eheh

Bem, foi uma noite muito agradável e embora não deseje que a história dos teus aniversários volte a ter tais contornos, foram pormenores sem dúvida marcantes :) e não voltes a falar das ressacas de soro, que são altamente pois sem querer desfizeste um mito...

Ah e é verdade!! Estarei sempre do outro lado da estrada Ok ;)

Lipe

Bri said...

:):):)
Venham então mais 365 dias!! :)
E já sabes, só tens é que ter mais cuidado com aqueles brancos que pegam fogo!!
:):):)

Anonymous said...

Amei!!!!
Escreves muito bem, tão bem que
quase me senti com essa bebedeira. Só te esqueceste de falar no hálito :) Brincadeirinha...
Desta vez, só faltou haver uma Ana Martins a correr à frente da ambulância para abrir caminho.
Foi uma noite agradável...E há fotos para mais tarde recordar ...
Helder, só mais uma coisinha... Danças muito bem!!!
Dudu

Pi said...

entraste em grande nos 31 helderzito :)

será sempre uma noite memorável eheheheh e com o tempo... algum tempo... ainda nos vamos rir :)

beijo muuuito grande
e que seja a ultima vez que nao partilhas os kalash's conosco :)

pi

Anonymous said...

Ao meu querido padrinho que tem e sempre terá um cantinho mto especial no meu coração as melhoras e desejos de 364 dias mais calmos que o primeiro da caminhada dos 31 :)....tu e a todos vocês que sempre foram os meus amigos desde que cheguei à invicta (vocês sabem quem são)....
Vou aproveitar para dizer que, embora mto ausente vos tenho sempre comigo e que, neste momento, mais do que nunca, sinto a falta de estar na vossa maravilhosa companhia.
De facto, vocês são unicos e autênticos e sempre me acompanharam nos bons e maus momentos......
Beijinhos muito grandes e as minhas maiores homenagens a todos voces pelo que hoje sou.....